quarta-feira, 24 de novembro de 2010

devaneio insular

Se lançar em alguma coisa que desconhecemos. Não é esse o ato de viver? Estar constantemente mergulhando num poço do qual não se sabe o fim? Estar constantemente se debruçando num precipício e lançando seu corpo ao vento para, num suspiro, esperar por um milagre que tornará sua existência mais leve que o ar? Qual será a insustentável leveza do ser? Lutamos por corpos mais leves assim como lutamos pelo "abandonar a si", pois queremos nos desprender desse corpo assim como as folhas um dia se desprendem das árvores. Pois as arvores tem raízes que as atem ao chão, assim como o corpo tem pés e nos acorrentam à terra. Em matéria de pensamento, nos encontramos tão distantes de um significado para a vida tal como nossos pés se encontram longe das estrelas. Ainda assim, por devaneios, esperamos caminhar por entre estrelas quando, em verdade, estamos despencando dos céus e indo de encontro aos pés na terra. Ser apenas uma estrela cadente, é esta a tarefa urgente do ser que existe no homem.

quinta-feira, 18 de novembro de 2010

esboço para uma história da filosofia crítica


Renè e sua crítica da dúvida cartesiana:
Descartes costuma, comumente, ser lembrado pela sua postura cética no momento inaugural de sua filosofia. Esse ceticismo é, sobretudo, uma iniciativa natural do seu modo de pensar e abriga, no cerne de sua orientação, uma postura muito comum, e de certa forma original e embrionária, da consciência de sua época: a postura crítica. Descartes foi o filósofo que acolheu em suas reflexões os desdobramentos de sua época, a saber, a Revolução Científica. O movimento iniciado com os cálculos de Copérnico deu luz a uma nova Era do ocidente e apontou ao homem europeu o destino do horizonte vislumbrado pelo Renascimento. Neste litigante período histórico, não foi apenas o homem que perdeu seu lugar no mundo, mas sim o próprio mundo que deslocou seu eixo e ganhou novos fundamentos no pensamento científico racional em oposição ao pensamento teológico cristão. Agora esse mundo, antes fechado num sistema metafísico de revelações harmónicas herdadas desde a Antiguidade, havia sido aberto ao questionamento matemático e experimental do empirismo e racionalismo europeu. As dúvidas cartesianas são um reflexo dessa nova atitude perante a afirmação do mundo. Pois o filosofo faz uma volta a si mesmo e, dentro de si, procurar inverter as ciências admitidas até então e tentar reconstruí-las, oferecendo as um fundamento seguro, fundamento este que na sua filosofia ficou bem conhecida como o ego cartesiano. Mas na busca natural por um fundamento seguro ele não só põem em dúvida a realidade a sua volta, como também investiga a possibilidade de um campo seguro para a construção de uma ciência universal. É justamente neste “por em dúvida” que se efetiva sua atitude crítica. Duvidar de algo é por em crítica o seu conjunto de validades. Essa postura tende a ser reformadora na filosofia pois sugere um novo modelo de metafísica que se evidenciará no ideal cartesiano de scientia universalis. Era o berço de nascimento do homem moderno.

Kant e a sua crítica da razão :
Em pouco mais de um século o mundo europeu vivenciou e abrigou um surto de inovações que se estendiam desde a esfera do conhecimento científico até ao âmbito das revoluções sociais e econômicas que implicaram, na Inglaterra, uma mudança da estrutura política inaugurando, assim, a vida política no mundo burguês. Passando pela publicação de “As Revoluções das Órbitas Celestes” de Copérnico até a “Principia Mathematica” de Newton ou pelas Revolução Puritana até Revolução Gloriosa, novos ideais começavam a movimentar a consciência do homem moderno, ideais esses que, tal como conhecemos hoje, ficaram marcados no movimento tido como Iluminismo. Na Alemanha, então inda um arquipélago político de principados, o Iluminismo, ou “Aufklarung”, enfrentava os problemas da metafísica iniciada em Descartes e refutada por Hume; isto é, assim como Descartes havia fundamentado todo pensamento moderno numa atitude racionalista, o espírito científico de Bacon de Verula havia instigado os pensadores John Locke e David Hume a refundamentarem o homem moderno num pensamento empirista. Era o “teatro de infindáveis disputas” entre os empiristas e racionalistas. No âmbito de um desenvolvimento da disciplina metafísica na filosofia, a missão do filósofo que há de suceder a esse embate, a filosofia de Kant, vai consistir em dar pleno remate e terminação a essa disputa da consciência moderna. É neste entrave que ascende a filosofia crítica de Immanuel Kant. A atitude crítica kantiana vai se constituir no que o próprio filósofo chamou de “tribunal da razão pura”; isto é, Kant visa apurar as questões levantadas pelos debates entre racionalistas e empiristas e para isso ele aborda o termo “critica” no seu significado grego: discernir, julgar. Dessa forma, o ideal da crítica na filosofia transcendental não é de condenar e acusar a razão humana, mas sim uma determinação ou distinção das suas fontes com referência aos seus âmbitos de aplicação e validade para poder, assim, avaliar o âmbito de validade da própria metafísica. É na originalidade desse projeto que Kant inaugura a sua “revolução copérnica” e desloca de eixo a matriz do conhecimento, antes situada no objeto, para o sujeito do conhecimento. Assim, pois, Kant encerrava um período da história da filosofia iniciada em Descartes. Era o fim da idade moderna.

Schopenhauer e sua crítica do teísmo ocidental:
A filosofia kantiana acabou influenciando todo cenário filosófico e se ramificando nas doutrinas de Fitch, Schelling, Hegel e finalmente Schopenhauer. Este último configurou sua filosofia de uma forma bem diferente da de seu rival, Hegel. Na esteira da revolução copérnica, a filosofia crítica, ao ver de Schopenhauer, era uma filosofia de crise, que inalgurava na filosofia, depois da Antiguidade e Renascimento, uma nova época do pensamento europeu: “Todos sabiam que acontecera algo de grandioso, mas ninguém sabia exatamente o quê.” A filosofia de Schopenhauer era tida pelo próprio como a obra do pensamento capaz de encerrar a transição entre moderno e o pôs moderno. Pois Kant havia levado aos chãos não apenas o mundo medieval, mas, principalmente todo o conjunto de valores idéias que se julgava pertinente situar no cerne do pensamento tomista/agostiniano. O idealismo representava o foco central da crítica de schopenhauer pois ele significava, não só uma superação do realismo e do materialismo, mas também uma refundamentação epistemológica e uma crítica aos antiguíssimos preconceitos do teismo europeu. Tal projeto preconizado por Kant e estendido por Schopenhauer atendia pelo título de "crítica do teismo ocidental".

quinta-feira, 11 de novembro de 2010

condições lúdicas

Numa imensidão escarlate pequeninas faíscas de luz pipocaram irradiando sua beleza para o firmamento celeste. Pequenos floquinhos de terra se aglomeraram e num movimento só compuseram a sinfonia do universo; um por um foram eles, como instrumentos conjugados, formaram os primeiros corpos que cirandaram no espaço em torno de uma força de luz chamada Sol. Então num inexprimível espaço de tempo o inexorável aconteceu: num desses astros algo peculiar, um milagre havia desabrochado: vida. Criaturas estranhas essas que caminhavam pela superfície do planeta. Criaturas estranhas essas que aprenderam a amar, e por amor buscaram entender os astros, as estrelas, os animais, as nuvens;mas só não entendia o ímpetos que os instigava a cada minuciosa investigação, fosse no campo celeste ou fosse na interioridade, não entendiam o próprio amor.
poderia ser esse um mito sublime do paradoxo da vida: sentir e entender. Poderia ser essa uma linda empopéia inventada por alguém sabido da sua própria natureza, mas nem por isso teria ilustrados o quão lamentável é essa condição humana. o que é essa condição que nos acorrenta à angústia de desfrutar do mais belo e sublime da vida, mesmo sendo um desfrutar volitivo e cego, carente de qualquer faculdade elucidativa? o sentimentos permeiam a vida tal como a água faz com o oceano ou tal como o ar faz com o vento: eles são em si a quintesséncia, a matéria constitutiva da cada passo, de cada sopro e de cada beijo. Eles são para nós o que é a música para a orquestra, o que são as cores para a pintura. Eis o paradoxo!!! TU não consegues, cara amiga, contemplar o abissal fundo do poço?! Não?!... não te preocupes, pois aquilo que se estende até o âmago de nossos sentidos passa por despercebido até aos olhos dos mais sábios. não queremos ser sábios, queremos ser artistas, pois o que é o artista se não o homem que deixou de ser homem para constituir-se na revolução criadora das idéias paradoxais lastradas nos sentidos carentes de razão, sentidos estes que dançam no campo como fazem o próprio vento que acaricia a grama e balança a copa das árvores? Espírito! Somos o espírito criador do homem, o eterno retorno ao suspiro sem beijo!
Contemples, pois, o paradoxo! os sentimentos são como o olhar que apenas intui, não enxerga; a mão que apenas sente, mas não toca; a voz que apenas grita, mas sem som. Eles são mudos, cegos e insensíveis, mas também, enxergam o invisível, agarram o abstracto e gritam o indizível. Paradoxo oceano sem fim! Sentir é intuir no espírito a certeza contemplada apenas aos olhos do cego que já se apaixonou ou aos ouvidos do mudo que já cantou!
Farei-me cego, farei-me surdo e mudo, mas nunca deixarei de sentir em ti a minha mão passear, minha mão acariciar e fechar os dedos em cada canto de seu corpo, sem nunca te tocar. tocar-te-ei com o espírito. Sentir-te -ei com o coração. Isso nós não precisamos entender, apenas sentir. è essa a beleza do paradoxo que nos transforma em quase homens: poetas.